Crônicas

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Alucinação

Os dedos batem com furor no teclado da máquina de escrever, enquanto as palavras vão se formando no papel, dando uma consistência real às idéias elaboradas na mente humana. Mas num relance tudo se torna turvado, as vogais começam a trocar de posição e o que está sendo escrito perde o seu sentido.

Efeitos da Lei Seca

Era uma vez um grupo de quatro amigos, todos na faixa dos sessenta e poucos anos e bem-sucedidos na suas atividades profissionais. Eles reuniam-se todas as quintas-feiras ao cair da noite para trocar idéias, contar anedotas, comentar os últimos escândalos e as roubalheiras político-administrativas e colocar os temas vigentes (regionais e nacionais) em dia.

Meu inimigo, o Mosquito

Eu estava entrando naquele mágico-encantado território entre a vigília e o sono, com o corpo já meio entorpecido e a mente começando a ser transportada para o fantasioso mundo dos sonhos quando... um perturbador zumbido, tão irritante quanto uma britadeira, penetrou pelos meus ouvidos e interrompeu, num segundo, todo o devaneio. Um mosquito!

Num bonde no Flamengo

Na doce manhã primaveril eis que eu estava debruçado na amurada da praia do Flamengo. Reencontrava-me com desejos e anseios perdidos por ali, enquanto observava, com profunda melancolia, as máquinas hostis encarregando-se de destruir a graça antiga do local, tão exaltada pelos poetas do nosso e de outros tempos.

Os Andarilhos na Beira Mar

As caminhadas e o jogging na Avenida Beira-Mar Norte da capital catarinense são hábitos relativamente recentes. Em épocas mais provincianas, nenhum cidadão - ou cidadã - "de respeito" saía às ruas de tênis, trajes esportivos e indefectíveis bonés só com o objetivo de se exercitar andando ou correndo.

A Alegre (e Triste) Sina de Nelson do Cavaco

Nelson é um músico. Tocador de banjo, cavaquinho, violão e o que der e vier. A exemplo do seu xará, o grande sambista carioca Nelson Cavaquinho, é ele também exímio instrumentista e cantor e primeiro quilate. E pode ser encontrado quase diariamente (quando não está curtindo mágoas por aí), nas imediações do Mercado Público, aquela região da cidade repleta de verduras, frutas, peixarias e botequins.

A Moça na Praia

Já concluíram poetas e filósofos, após infindas elucubrações, que bom mesmo é o estar-no-mundo. Quanto a isto conjeturava o protagonista, enquanto divisava, à sua esquerda, na praia, de flanco sobre a areia, a bela jovem. O seu todo bem modelado e bronzeado corpo luzia, sob o sol de novembro, a ondulação perfeita de suas linhas projetando-se no contornante espaço.

Arranja um assunto aí!

O editor do Caderno de Variedades estava num dia efetivamente aziago. Como se não bastasse a falta de dois redatores, o freelancer, que prometera uma reportagem para a primeira página, dera o cano. E agora ainda mais esta: a crônica para a página cinco também não aparecera. Assim era demais!

As Pedras de Itaguaçu

O visual da Praia de Itaguaçu, em Coqueiros, é um dos mais raros e esplendorosos do mundo. As suas plásticas pedras emergindo das águas, com uma grande variedade de formas e dimensões, como se fossem esculpidas com capricho pelo Criador Supremo, in Person, têm surpreendido e encantado muitos visitantes.

Atribulações de uma Viagem Aérea

Esclareça-se a tempo o transcorrer normal da viagem até São Paulo. Os problemas surgiram na chegada quando um pouso nada suave arremessou o avião até certa margem da pista, para depois impeli-lo a um giro de 180º, deixando-o exatamente virado à direção de onde tinha vindo. Compreensível, portanto, a agitação reinante a bordo, no momento em que o aparelho se imobilizou e todos se reconheceram sãos (?) e salvos.

Aventuras e Desventuras pelo Hinterland Catarinense

Aquela seria a nossa mais longa jornada. Uma semana percorrendo diversas regiões do estado. Na madrugada da partida, lá estávamos, a postos: Marcílio e eu (repórteres), Paulo (fotógrafo) e Martinelli (cinegrafista). Éramos do GRP, excetuando Martinelli, que pertencia a “Produções Carreirão” e estávamos incumbidos de mais uma missão jornalística, junto à comitiva governamental, pelo hinterland catarinense.

De Como Deixar de Fumar

Resolveu deixar de fumar... Até aí tudo muito fácil, enquanto a ação não passava ainda de uma simples resolução. Mas daí, temendo e prevendo as facilmente previsíveis dificuldades, Chagas (este o seu nome) estabeleceu um prazo a si mesmo: noventa dias. Durante esse período iria, pouco a pouco, largando o tal e tão prejudicial vício.

Diálogo no Elevador

CENÁRIO: Elevador de um edifício localizado no centro da capital catarinense, em horário comercial. No seu interior encontram-se dez passageiros e a ascensorista (de belos joelhos!). De repente, entre o 7º e o 8º andar, o elevador, sem dar a menor explicação, deixa-se dominar por inquietantes convulsões - como um avião que se defronta com tempestuosas nuvens -, e interrompe abruptamente a sua trajetória.

Do Oriente, Confuso e Sem Fusos

Uma coisa logo constatei, ao chegar ao outro lado do mundo, ou para ser mais explícito, no aeroporto de Narita, a 100 km de Tóquio. Qual seja: a burocracia lá é tão xarope quanto a nossa, apesar de melhor organizada. Pois foi na própria alfândega, sob o olhar amendoado de um por demais exigente Immigration Inspector, que me vi às voltas com o meu primeiro impasse, no Oriente.

Em Busca do Ciborg

De repente, não mais que de repente, como diria o poeta Vinícius de Moraes, me vi, sem querer, ou nem mesmo pressentir, num luminoso e calorento dia de verão, em busca do homem biônico, também conhecido como “o homem dos seis milhões de dólares”, ou ainda, para os íntimos, pela alcunha de Ciborg. Aliás, eu não estava sozinho.

Galinha All Right

Quando Zorro, Tonto e Mandrake embarcaram no Silver, naquele belo fim de tarde de junho, já tinham um objetivo delineado: fazer uma visita a Zé Bugrão, no seu sítio, nas proximidades de Santo Amaro de Imperatriz.

João Gilberto em Floripa

No início da década de 1960, a Bossa Nova (“oficialmente” lançada dois anos antes começava a ganhar adeptos entre a classe média sofisticada e círculos intelectuais, principalmente no Rio e em São Paulo. E o nome mais representativo do novo estilo era João Gilberto.

Juca da Silva, um Sofredor

Quero vos apresentar João Onofre Godofredo da Silva, vulgo Juca da Silva, 48 anos, instrução secundária, funcionário público estadual, viúvo, cinco filhos e habitante da cidade erguida sobre a Ilha de Santa Catarina desde que nasceu.

Matutinos, Diurnos e Noturnos

Segundo uma nova teoria que paira no ar e com a qual eu concordo até certo ponto, o homem, isto é, o ser humano bípede e implume, dos sexos masculino e feminino, pode ser dividido em três categorias, a saber: matutino, diurno e noturno.

Meu Encontro com Clarice

Como se não bastasse a claridade do começo da tarde, havia no ar uma renascida esperança. Sentado num bar de beira de calçada, em Botafogo, tomando um chope, eu transformava minha solidão em conformada trégua e deixava-me levar pelas flutuações da narcotizante temperatura.

No Mundo dos Heróis

Em verdade vos digo que naquele tempo havia em cada rua um campo de futebol, um terreno baldio e uma casa em construção. As ruas eram adolescentes e surgiam vigiadas com desconfianças pelos sobradões remanescentes da era colonial.

No Tempo dos Seriados

As manhãs eram sempre deslumbrantes, naqueles sábados, principalmente por que as aulas terminavam mais cedo. Nada mais compreensível, portanto, que subíssemos a ladeira da escola em tremenda disparada, a fim de saber quais as atrações que nos reservava a programação de fim-de-semana dos cinemas, em especial àqueles que apresentavam faroestes e seriados.

O Amigo de Infância

Havia poucas pessoas no bar, quando nós entramos – um bar das imediações do Mercado – e, num canto penumbroso, sentado sobre um caixote, percebia-se a frágil figura imobilizada em frente a um cálice de cachaça.

O Homenzinho dos Guarda-Chuvas

O homenzinho dos guarda-chuvas anda léguas para cumprir o seu ofício. Trata-se de uma figura franzina, usando minúsculos óculos escuros e surrado chapéu de feltro, e caminha sempre com passos ligeirinhos com uma sacola onde é colocado o seu estoque.

O(s) Gol(s) e a Crônica

“O difícil, o extraordinário, não é fazer mil gols como Pelé. É fazer um gol como Pelé”. Palavras do poeta e cronista Carlos Drumond de Andrade, publicadas no Jornal do Brasil. Pois a façanha que o “Rei” está prestes a concretizar – algo digno de um verdadeiro artista – motivou uma memorável crônica do mestre Drumond, uma lição de bem escrever, nesta época em que a cafonice é louvada e as baboseiras borbulham no ar."

Profecias Furadas

Nos meus tempos infanto-juvenis (que já vão longe) o ano 2000 configurava-se como o símbolo do futuro. As cidades teriam dimensões colossais, lembrando o visual do filme Metrópolis, com cilíndricos edifícios de mil andares interligados entre si e o céu coalhado de veículos espaciais, substitutos dos obsoletos automóveis.

Um Fato e Várias Versões

B. B. Boaventura, empresário catarinense radicado no Paraná, chegou ontem a Florianópolis, a fim de examinar a possibilidade de realizar importantes investimentos em nosso estado.

A (des) igualdade dos Sexos

Durante todo o transcorrer do século 20 as mulheres lutaram para conquistar os seus direitos e mostrar a sua igualdade perante a sociedade machista. Se considerarmos que até as décadas de 20/30 elas nem podiam votar, a evolução foi notável.

Emoções Químicas

As emoções e os sentimentos têm servido há séculos de matéria-prima para a inspiração de poetas dos mais diversos quilates, desde os trovadores medievais a Shakespeare, Vinicius e Drummond, passando por melodramáticos como J.G. de Araújo Jorge (cujos derramados versos “mentirosa mulher que tanto amei...” fez muito sucesso na Floripa da era do rádio).

A Grande Noite de Pelé

Após muitos anos jogando todos os dias, Pelé finalmente acertou num palpite que lhe veio num sonho e ganhou dez mil reais no bicho. Mas, antes que haja algum mal-entendido, explique-se: o Pelé em foco não é Edson Arantes do Nascimento, ídolo dos gramados e considerado o maior jogador de futebol de todos os tempos.

A cuidadora de Pombos

Em recente viagem a Barcelona hospedei-me no Olivia Plaza Hotel, localizado na deslumbrante Plaça de Catalunya. Da janela do quarto, no sexto andar, tem-se uma ampla visão da praça, com suas estátuas e monumentos, além de um belo chafariz, que, ao cair da noite, ilumina-se com jatos de luzes e cores.